CONTÍGUO à Igreja de Nossa Senhora do Parto ( demolida), pelo lado da Rua Rodrigo Silva até à da Assembleia, erguia-se outrora um grande edifício retangular de três pavimentos – o Recolhimento do Parto. Sua pedra fundamental foi lançada em 1742, mas somente em 1759 ficou pronto, tendo sido inaugurado pelo bispo Dom Frei Antônio do Desterro.
Destinava-se o estabelecimento a albergar mulheres de vida desonesta que, arrependidas do pecado, procuravam na religião o caminho da regeneração.
Com o correr dos tempos, porém, deturpou-se a finalidade da louvável instituição. Transformando-se em verdadeiro presídio, passou a receber também esposas infiéis e meninas e moças que se insurgiam contra as determinações paternas. Tornou-se, assim, o Recolhimento uma terrível ameaça contra o belo sexo, passando a significar, no dizer de Joaquim Manoel de Macedo, “uma espécie de casa de correção feminina, uma espécie de cadeia que fazia medo, não só às más esposas, como às esposas de maus maridos, e também às moças solteiras, filhas de pais enfezados, cabeçudos e prepotentes”. Bastava um marido tirano querer livrar-se da esposa, para logo interná-la no Recolhimento. Não havia briga entre marido e mulher que não se arrefecesse imediatamente ao pronunciar das terríveis palavras: “Olha o Recolhimento do Parto!”.
Na noite de 23 para 24 de agosto de 1789, os habitantes do Rio de Janeiro foram despertados por uma fogueira colossal, que iluminou toda a cidade: irrompera incêndio no Recolhimento.
“As chamas envolveram o edifício – é o historiador Augusto Maurício quem conta – e, em pouco tempo, devoraram-no todo. A cidade inteira acudiu às imediações para assistir ao horrível espetáculo. Gritos lancinantes das reclusas, tetos fendidos que caíam com estrépito, madeiras estalando ao calor do fogo, e o fumo subindo ao céu em coluna negra estrelada de faíscas vermelhas”.
Afinal, após dramáticos momentos de angústia e terror, conseguiu-se arrombar as portas do asilo e libertar as “recolhidas”. E, quando as trevas daquela noite tenebrosa se dissiparam, nada mais restava do enorme casarão senão um montão de ruínas fumegantes.
No dia seguinte mesmo, porém, o vice-rei D. Luiz de Vasconcelos providenciou a reconstrução do edifício, sendo incumbido das obras o Mestre Valentim da Fonseca e Silva, que as terminou em menos de quatro meses, isto é, a 8 de dezembro daquele ano.
O Recolhimento do Parto existiu até 1812, quando as mulheres foram alojadas no Recolhimento da Misericórdia, onde esteve depois a Escola de Medicina. Quanto ao prédio, sobreviveu até 1906, ano em que foi demolido para alargamento da Rua da Assembleia.
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